06 abril 2007

A LEI DO "BISPO" AMÍLCAR


RÉPLICA
São indisfarçáveis os traços autoritários do escritor Amílcar Neves, membro ativo daquela igrejinha que costuma julgar, condenar e executar seus desafetos com o desassombro inquisitorial de um Torquemada, com a mesma desenvoltura “santa” do padre dominicano Savonarola, que mandava recolher, empilhar e queimar, na chamada “Fogueira das Vaidades”, tudo o que ele julgasse indecente, pagão ou imoral - telas de Botticelli, por exemplo.

Em recente coluna, o “bispo” Amílcar pintou o Governador Luiz Henrique como um capeta presunçoso e, daí em diante, com picardia velhaca, protagonizou uma patética sessão de descarrego.
Do alto de sua fé inabalável, “adivinhou” desejos íntimos e, com base numa realidade virtual por ele próprio construída, tentou exorcizar o que julgava ser uma “inquestionável veleidade literária” do Governador. Com seus óculos psicodélicos, “enxergou” uma inevitável (ainda que inexistente) candidatura à Academia Catarinense de Letras, dando-se ao trabalho de apontar os melhores caminhos para o êxito da empreitada e até especular sobre a data em que isso ocorreria. Já no final da sessão, baixou um “santo” um tantinho mais humilde, e ele passou a fazer apostas no futuro “com razoáveis chances de acerto”.
Em sua lógica perturbada, o “bispo” Amílcar confunde tudo. Seus argumentos lembram os de alguém que, diante da explicação de que um avião avariado caiu por causa da Lei da Gravidade, passa a acusar o interlocutor de defensor da queda de aviões e que, entre vidas humanas e a Física, o desalmado e insensível optou pela Física.
Continuo a achar libertadora a lei da gravidade...
O resto de seus argumentos e acusações nem merece contradita, pois serve apenas para repisar uma falsa (e politicamente interesseira) clivagem entre Florianópolis e Joinville. Sua retórica de pé quebrado não estimula contestação, pois apenas evidencia que nada ilude tanto a verdade quanto uma mentira declamada como manifesto por justiça, tomando a si a causa dos inocentes e desvalidos da sorte.
Esse teatrinho tosco, de usar ONGs, movimentos sociais e sociedade civil organizada como laranjas, para encobrir interesses e benefícios privados, já cansou e resta desmascarado e nu em praça pública.
Está aí um desvio da esquerdopatia. Liderança política — eleita — não se iguala a “movimentos sociais”. O primeiro é uma instituição do Estado de Direito. Os outros são grupos de pressão, com noções parciais do que seja justiça, tentando universalizar a sua agenda particular.
Vivemos tempos em que a hierarquia de valores que regula a vida em sociedade vem sendo sistematicamente solapada, assim como as instituições que garantem nossa frágil e delicada democracia.
Em seu texto, o “bispo” Amílcar revela ser daqueles que acham que vale atribuir ao adversário uma intenção que ele não tem, obviamente mentirosa, e, a exemplo do que afirmou Lula num debate, “o outro que desminta". Em sua coluna, o “bispo” Amílcar demonstra fazer parte do time de Jaques Wagner, governador eleito da Bahia, que, sob o pretexto de defender o bom princípio de que ninguém é obrigado a se auto-incriminar no estado de direito, afirma que o acusado tem o "direito de mentir".
Fora da realidade virtual construída pelo “bispo” Amílcar, no mundo de verdade as características do Governador Luiz Henrique estão bem distantes da imaginária presunção, da fantasiosa pretensão ou de inexistentes veleidades mesquinhas.
E contra fatos não há argumentos. Desconheço qualquer outro político que tenha proibido o uso de seu nome em prédios públicos. Desconheço qualquer outro político que tenha proibido o uso das “tradicionais” fotos oficiais em repartições públicas. Desconheço qualquer outro político que tenha renunciado ao mandato para concorrer em igualdade de condições com seus adversários.
Esta é a Lei LHS!
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OBJETO DA RÉPLICA
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A Lei LHS
04/04/2007
São inquestionáveis as veleidades literárias do governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira. Seu desejo íntimo é um dia tornar-se um intelectual respeitado, um erudito homem de letras, um autor de inúmeros títulos publicados em forma de livro, um ensaísta de idéias brilhantes e originais, um articulista arguto e refinado, até mesmo um ficcionista inovador e revolucionário - um completo e acabado pensador da cultura cristã ocidental, enfim.Mais cedo ou mais tarde, haverá ele de candidatar-se à Academia Catarinense de Letras. Para isso, é necessário antes que se declare vaga uma das 40 cadeiras da agremiação literária, hoje todas muito bem ocupadas. Depois, caso o infausto acontecimento da morte de um dos nossos imortais venha a ocorrer ainda nos próximos quatro anos, restará saber se a sua decisão de pleitear o posto conseguirá aguardar até o final do seu mandato governamental. A pretensão acadêmica do governador é justa e cabível, assim como cabe com justiça a qualquer cidadão que more em Santa Catarina ou no Acre, em Paris (França) ou Astana (Casaquistão). Basta cumprir os requisitos exigidos para o posto e seguir fielmente os rituais estabelecidos para alcançá-lo através de eleição direta e secreta - coisa esta que não fará medo algum a um político que já foi por três vezes prefeito de Joinville, a maior cidade do Estado, e reelegeu-se governador de Santa Catarina no ano passado. Seus métodos para se consagrar como um paladino da Cultura, porém, é que têm se mostrado tortuosos e nebulosos. Por exemplo: o governador fica indignado quando lhe cobram as providências legais de amparo à Biblioteca Pública do Estado, que é pública e estadual como o nome muito bem a descreve, pois, em seu entendimento obscuro, isso significa que a cidade de Florianópolis estará se beneficiando abusivamente de recursos estaduais, enquanto lhe parece límpido e irrepreensível que vultosos recursos do tesouro estadual sejam repassados diretamente por seu gabinete à Escola do Teatro Bolshoi no Brasil, uma entidade de "autoria" da Prefeitura Municipal de Joinville precisamente quando Luiz Henrique era prefeito daquela importante cidade. Seus métodos de consagração cultural certamente se hão de aclarar com o envio de algum dos novos projetos de lei que complementarão a reforma administrativa. Como se sabe à exaustão, a presente reforma, que liquida através dos artigos 101 e 189 as 15 instituições culturais ligadas ao governo estadual, não se esgota com a votação de hoje, 4 de abril, no plenário da Assembléia: outras medidas serão encaminhadas em doses homeopáticas a partir desta quarta-feira, num processo kafkiano cujo encerramento jamais se poderá saber quando ocorrerá - sempre e a qualquer momento poderá cair uma nova reforma no colo de todos nós. Dadas suas aspirações acadêmicas e literárias, pode-se apostar, com razoáveis chances de acerto, que o governador se espelhará em antecedentes federais e proporá uma nova lei de incentivo à cultura, tal como o fez o ex-presidente Sarney. Com base neste exemplo, é lícito imaginar que, aperfeiçoando a Lei Rouanet (que aprimorou a Lei Sarney), cá teremos em breve, aprovada pelos deputados estaduais catarinenses por 27 votos a 13, uma Lei LHS sem que ninguém saiba como ela tratará as questões da Cultura, pois tem sido marca deste governo reformar sem saber como as coisas funcionam na vida real e sem ouvir, no caso, o Conselho Estadual de Cultura, que existe exatamente para isso - aconselhar -, a própria Academia e o Instituto Histórico e Geográfico, entidades reconhecidas pela Constituição do Estado. Talvez a Lei LHS apenas crie a 41ª vaga, de uso privativo, na Academia de Letras...
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Crônica do leitor
28/03/2007
Esta crônica de hoje parecerá unilateral e tendenciosa. Desculpem-me. A verdade, porém, é que não recebi um único e-mail favorável ao desmonte da Cultura pretendido pelo governo do Estado. Não consegui surpreender nos jornais uma única carta de leitor defendendo a proposta insana: nem de terceiros, nem de simpatizantes ou membros do governo. Aliás, nem mesmo Luiz Henrique da Silveira, que assina artigos dominicais em um jornal da sua cidade, ousou defender de público as próprias idéias "reformistas" para a Cultura. De Eglê Malheiros, que foi professora de Luiz Henrique, e Salim Miguel, escritores: "É mesmo muito triste que, em vez de nos mobilizarmos para dar passos à frente, tenhamos de lutar para tentar impedir o retrocesso; a vida se torna um tormento quando o valor determinante do convívio social é pura e simplesmente o cifrão; seria bom que o governador (e também os senhores deputados) se lembrasse de que 'todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido', em prol do povo, jamais em prol da especulação imobiliária; usar a palavra 'cultura' nos discursos e entrevistas nada significa se, na verdade, as ações são contra as instituições e patrimônios culturais." De Daniel Ballester, escritor argentino, apresentador de programas culturais nas rádios La Voz de las Madres e Nacional, ambas de Buenos Aires: "Cualquier espacio físico donde deban custodiarse libros u otros soportes gráficos siempre es un dolor de huesos para las autoridades del signo que sean a la hora de decidir cuál será el ámbito que deban ocupar. (...) Todos hemos leído con mucho placer al menos un libro en nuestra vida, menos aquellos que deciden que hacer con los libros. Ellos no leen, ellos queman, olvidan, ensucian, deportan, exilan, maltratan, ajan, sepultan... pero no leen." De Bido Muniz, jornalista concursado da Rádio Senado, de Brasília - sarcástico e cruel: "Acho que na crônica do Ademar Cirimbelli tem uma pista importante. O problema não seria justamente a carência de leitura do nobre governador. Tenho um palpite: ele interpretou mal a padroeira do Estado: Santa Catarina de Alexandria! Pois é: não foi lá que andaram queimando uma biblioteca?" De Sonia Sales, professora universitária em São Paulo, indignada em negritos garrafais: "É uma vergonha!!!!!" De Bráulio Maria Schloegel, ex-professor da Furb, ex-membro do Conselho Estadual de Cultura, ex-presidente da Fundação Cultural de Blumenau: "Tenho acompanhado por intermédio de seus artigos no Diário Catarinense a sua defesa contra a privatização da nossa sesquicentenária Biblioteca Pública Estadual. Estou solidário nesta luta. Espero que mais esta violência não se concretize contra a cultura catarinense." De Maria de Fátima Barreto Michels, candente e desencantada, professora em Laguna: "Quando os livros passam a ser problemas ao invés de soluções, caro escritor, é sinal de que nossos deputados, prefeitos e governadores são avessos à leitura. Querem livrar-se do estorvo. Livro é patrimônio que custa dinheiro para manter. Só países adiantados cuidam de seus livros. Por aqui a coisa anda feia. E triste. O Brasil está muito triste. Muito triste, caro colunista." Dos deputados estaduais de Santa Catarina, votando o projeto do governo.