30 novembro 2006

POBRE SAUSSURRE!
(enviado como comentário ao blog do Reinaldo Azevedo no dia 30/11/2006)

Caríssimo Reinaldo,
Parece que estamos começando a ficar competitivos na "guerra de valores" que você tanto propugna. E pode ficar gabola e convencido, pois, certamente, você tem muito a ver com isso.
Digo isso sob os eflúvios nauseabundos do texto de Bernardo Kucinski, que gorjeia como um xexéu lá no arraiá dos "minhocartas". O texto pretende desfazer a idéia defendida pelo autor, em artigo anterior, de que a Radiobrás deveria se contrapor à narrativa de má qualidade da grande imprensa criando uma narrativa própria, mais ao gosto da sua grei. No entanto, ele se enreda ainda mais na teia confusa de suas idéias, pois parece não ter a mesma competência que os "profissionais" petistas da mentira têm para encobrir suas reais intenções.

Ele inicia o texto revelando ter se recusado a dar entrevistas solicitadas por dois jornais. Para um deles, disse ter respondido "meio brincando e meio a sério, que só dava entrevistas para estudantes de jornalismo, porque os profissionais tinham se tornado maliciosos demais para o meu gosto; deixaram de ser confiáveis".

Interessante... Malícia pode significar muita coisa ruim e condenável, mas também abriga a derivação, por extensão de sentido, agudeza de espírito, astúcia, vivacidade, estas, sim, qualidades muito pouco apreciadas pelos adoradores do "working class hero" tupiniquim.


Mais interessante...Jornalista e professor da Universidade de São Paulo, ele acredita que jornalistas devem ser confiáveis!?!?! O que é isso, companheiro? Quer dizer que para você jornalista bom é aquele que repete seu discurso sem desvendar o que nele há de ilusionismo, de logro, de release? Não, professor, jornalista deve ser confiável para o leitor, não para seus entrevistados, a quem, sempre que possível, deve esforçar-se por deixar nuzinhos em pelo, para que nós, os leitores, possamos enxergá-lo sem a farda, sem o brilho das medalhas, sem o verniz ofuscante da fama.


Querem entender melhor quem é e o que pensa o professor Kucinski? Vejam só o que o Google me deu de bandeja: em entrevista para o USP Online, ele afirma: "é preciso que haja uma ética dominante a seguir, mas em um mundo onde reina a multiplicidade, não existe mais uma só ética". O entrevistador revela sua perplexidade com tal afirmação e questiona: "De que forma a ´multiplicidade´ ameaça a existência da ética?". Aí Bernardo abre a guarda de vez, deixando cair a máscara: "A verdade de um indivíduo não é a de outro, e isso ameaça o senso comum e a construção da ética. Defendo que haja para o jornalismo um código de ética. Precisamos ter um código de conduta".


Não é incrível?!?! Ele quer um mundo em que não haja multiplicidade, mas univocidade, nos meios de comunicação. Deve ser aquele tal "outro mundo possível", onde a verdade de um indivíduo será sempre a mesma que a de outro. E ele ainda tem a pachorra de chamar isso de "senso comum", sem se dar conta de que está se indispondo com todo o pretenso ideário libertário do socialismo, propondo um "Consenso de Kucinski", um universo paralelo onde imperaria a idéia única, a verdade única, o pensamento único fundamentalista dos talebãs petistas, não deixando espaço para qualquer tipo de reflexão ou questionamento.

Veja só, Reinaldo, como Kucinski revela estar sentindo os seus golpes certeiros contra a glossolália petista: "Quando nós dizemos que queremos democratizar a comunicação no Brasil, eles entendem que queremos controlar a comunicação no Brasil; quando dizemos que os jornalistas nos devem uma auto-reflexão sobre o comportamento da imprensa, eles entendem que estamos pedindo que parem de criticar o governo. Quando dizemos que a imprensa está distorcendo determinada história, eles distorcem o que nós dissemos. E assim vai. Tudo o que a esquerda e, em especial, os petistas dizem, é entendido como o seu contrário". BINGO!!!

Percebeu como "elas estão descontroladas!!!" com a descoberta dos seus estratagemas tão bem urdidos e, até há pouco, despercebidos, por que bem camuflados?

Ele chega a dizer que "não existe mais uma língua comum entre nós" ou "trata-se da perda da capacidade de se comunicar. É como se vivêssemos numa babel", ou, ainda, "não mais compartilhamos a mesma matriz lingüística: cada um codifica e decodifica a seu modo".

Pois é, depois de anos de empulhação e construção de uma "verdade" farsesca e ardilosa, agora que a parolice dos emires, dos minhocartas e das marxilenas começa a ser decifrada e desencantada, ele se revolta e clama por uma volta àqueles tempos felizes em que tudo o que provinha das suas mentes, carregado de simbolismos e apelo popular, merecia da mídia um selo de qualidade inquestionável, pois sempre souberam manejar muito bem, com astúcia e sagacidade, conceitos como ética, utopia, ideal, interesse público, inclusão e outros quetais.

Querendo evidenciar sua erudição, ele lança mão de Saussure (só faltou o Chomsky, com Y), para quem "as idéias são nebulosas se não são enunciadas através de uma língua". Mas não respeita ou desconhece as idéias do lingüista suíço quando conclui que "é o que parece estar acontecendo conosco. As palavras já não demarcam de modo unívoco, porque para uns significam uma coisa e para outros o seu contrário".

VigeSanta!, Saussure deve estar se revirando no túmulo. Sua teoria delimita claramente a separação entre langue (língua) e parole (discurso). Para ele, a língua é um sistema de valores que se opõe uns aos outros e que está depositado como produto social na mente de cada falante de uma comunidade, possui homogeneidade e por isto é o objeto da linguística propriamente dita.


Diferente do discurso, que é um ato individual e está sujeito a fatores externos, muitos desses não linguísticos e, portanto, não passíveis de análise. Ou seja, o professor, como todo bom ilusionista, faz malabarismos com a mão direita (quando fala da língua) enquanto esconde a verdade com a esquerda (quando omite estar tratando de discurso).

Como você diz sempre: nisso não há loucura, mas método.





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No mesmo dia, não sei se sugestionado pelo meu comentário, o Reinaldo publicou este artigo arrasador contra o Kucinski. 

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