13 outubro 2012


HADLEYBURG REDIVIVA

Em 17 de julho de 2006, publiquei em meu blog um texto com o título “HADLEYBURG E O PT, TUDO A VER”. Vamos a ele.

O escritor norte-americano Mark Twain, autor das conhecidíssimas aventuras de Huckleberry Finn e Tom Sawyer, tem uma faceta pouco conhecida. Ele foi um dos mais ardorosos e contundentes críticos do imperialismo do seu próprio país, tendo publicado dezenas de panfletos que atacavam as ações ianques nas Filipinas, Panamá, México, Cuba, Nicarágua, República Dominicana. “Eu me recuso a aceitar que a águia crave suas garras em outras terras”, sentenciava. Acusado de traição, retrucava: “Eu gostaria de ensinar o patriotismo nas escolas, e o ensinaria assim: jogaria fora a velha máxima ´Minha Pátria, certa ou errada, minha Pátria´, e em seu lugar diria ´Minha Pátria, quando certa´”.
Twain foi, também, um analista feroz do american way of life. Escrita em 1899, “O Homem que Corrompeu Hadleyburg” é considerada uma de suas mais brilhantes histórias. Nela ele aborda o processo de derrocada moral de uma pequena cidade, até então considerada um reduto de excelência de conduta. “Hadleyburg era a cidade mais honesta e honrada de toda a região. Já mantinha esta reputação imaculada havia três gerações. (...) As cidades vizinhas tinham inveja dessa honrada supremacia (...) mas, mesmo assim, eram obrigadas a reconhecer que era uma cidade realmente incorruptível”. Assim começa a história da aparentemente pura e imaculada Hadleyburg, que, graças à engenhosidade da trama urdida por Twain, não resiste a parcas 50 páginas antes de revelar-se a mais mentirosa, corrupta e desprezível das cidades. Hadleyburg, no fundo, era uma farsa grotesca.
Quem destampou a caixa de Pandora daquele pequeno burgo foi um estrangeiro que, de passagem por lá, foi ofendido e humilhado por um dos seus ilustres membros. Rancoroso, durante um ano ele arquiteta sua vingança: corromper Hadleyburg!!! Depois de espalhar suas ardilosas armadilhas, as tentações pelo vil metal ganham corpo celeremente no povoado. Enquanto são facilmente derrubadas as máscaras, armaduras e carapuças dos 19 principais cidadãos, das 19 principais famílias, eles continuam recitando, maquinalmente, o mantra que ainda impregna suas mentes: “Não nos deixeis cair em tentação”. Mas, ao fim e ao cabo, vence a natureza humana, impondo-se, implacavelmente, sobre aquela frágil e débil pureza nunca antes testada. Todos se revelam torpes, vis, malignos, ignóbeis, desprezíveis, indignos, imorais, desonestos, aéticos.
Ao reler essa deliciosa história, não pude resistir à imediata correlação com o PT e sua história – vestais imaculadas transfiguradas em lambuzados mensaleiros, santarrões virginais metamorfoseados em quebradores de sigilo, torquemadas e savonarolas convertidos à liturgia profana de Jeany Mary Corner, pregadores flagrados pecadores, presos políticos reduzidos a políticos presos (quem dera!).
Quando Twain fala dos 19 íntegros e impolutos, a reação quase automática é começar a recapitular a débâcle petista para checar se há também semelhança numérica entre as histórias: José Dirceu, Waldomiro Diniz, Palocci, Juscelino Dourado, Rogério Buratti, Gushiken, Genoíno, Delúbio, Silvio Pereira, Marcelo Sereno, Henrique Pizzolatto, Jorge Mattoso, Okamoto, João Paulo Cunha, José Mentor, Josias Gomes, Paulo Rocha, João Magno - dezenove! BINGO! -, mas poderia ser bem mais, se incluíssemos o homem-cueca, os bispos aliados, os publicitários, os banqueiros et caterva...
Sucumbindo ao humor corrosivo de Twain, diria que essa súcia parece pautar-se no lema do desabusado Tim Maia: "Não fumo, não bebo, não cheiro; só minto um pouco".
A farsa do PT pode ser bem entendida a partir do que disse o poeta norte-americano Stephen Vincent Benét: "Se a idéia é boa ela sobreviverá à derrota. Se ela for mesmo boa, pode sobreviver até à vitória". Como se sabe, o PT sobreviveu a várias derrotas, mas foi incapaz de resistir à vitória.
Diante desse cenário devastador, desintegrador de valores e desarticulador das instituições, talvez só reste apelar para a farmacopeia moral disponível nas estantes dos tempos: Demócrates: “Tudo está perdido quando os maus servem de exemplo e os bons de deboche”. Jean-Paul de Gondi, cardeal de Retz: "Quando os que mandam perdem a vergonha, os que obedecem perdem o respeito”. Nathaniel Lee: "Quando homens pequenos lançam grandes sombras, é porque a noite está chegando". Disraeli: "O momento exige que os homens de bem tenham a audácia dos canalhas!!!". Mas, talvez, a melhor solução seja aquela sugerida (em tom de blague) pelo publicitário norte-americano Bill Bernbach: “Tenho uma grande ideia: vamos dizer a verdade!”.

Decorridos seis longos anos, a tênue esperança de ver certos ex-presos políticos reduzidos à republicana condição de políticos presos parece prestes a se concretizar, graças à coragem, à audácia, à honradez, à altivez, à sobranceria, à dignidade, ao brio da maioria dos 11 do Supremo.

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