20 setembro 2006

GRAMSCI E O OVO DA SERPENTE


Os catarinenses, felizmente, já decidiram pela continuidade da descentralização, que vem espalhando o desenvolvimento de forma equânime por toda Santa Catarina. Por isso, não vou ocupar-me da nossa refrega estadual, concentrando meu foco no pleito nacional.

Pregado na cruz, Jesus disse: “Pai, perdoai-os, eles não sabem o que fazem!”. Mas o mesmo Jesus saiu no braço contra os vendilhões do templo. Recordo essas duas passagens para ressaltar a nossa responsabilidade diante do quadro de descalabro moral e ético que assola o país, com mensaleiros, sanguessugas, chantagistas, sucedendo-se um após o outro em ritmo alucinante, tornando real a blague “de hora em hora, tudo piora”.
Pode-se perdoar os alienados, que não têm acesso às informações necessárias à formação do seu tirocínio. Pode-se perdoar o miserável, que enxerga na esmola estatal o máximo que lhe cabe neste latifúndio. Pode-se perdoar até mesmo o ingênuo, que não consegue decifrar as armadilhas do populismo ou se desvencilhar das artimanhas do gramscismo, vírus que se instalou de forma lenta, gradual e segura nos nossos corações e mentes. Mas não se pode perdoar a leniência, a displicência, a passividade diante de tudo o que estamos assistindo.
Para quem não sabe do que se trata, é de fundamental importância informar-se sobre esse tal gramscismo, pois grande parte do que ocorre hoje em nosso país é fruto da eclosão desse “ovo da serpente”. Tentarei fazer uma síntese, com a ajuda do historiador Carlos Azambuja.
O italiano Antonio Gramsci, um dos fundadores do Partido Comunista Italiano, foi o primeiro teórico marxista a compreender que a revolução na Europa Ocidental deveria se desviar do rumo seguido pelos bolcheviques russos, propondo uma alternativa ao “Que Fazer?” leninista.


Para Lênin, a revolução comunista deveria começar pela tomada do Estado e, então, transformar a sociedade. Gramsci inverteu esses termos: a revolução deveria começar pela transformação da sociedade, tomando da classe dominante a direção da “sociedade civil” (rede de instituições educativas, religiosas e culturais que disseminam modos de pensar) e, só então, atacar o poder do Estado. Sem a prévia “revolução do espírito”, qualquer vitória comunista seria efêmera.
Segundo Gramsci, o objetivo era conquistar, um após outro, todos os instrumentos de difusão ideológica (escolas, universidades, editoras, meios de comunicação social, sindicatos), já que os principais confrontos ocorrem na esfera cultural e não nas fábricas, nas ruas ou nos quartéis.
Para Gramsci, a batalha deveria ser travada no plano das idéias religiosas, filosóficas, científicas, artísticas etc. Por essa razão, a caminhada para o socialismo não passaria pelos proletários de Marx e Lênin ou pelos camponeses de Mao, mas, sim, pelos intelectuais, pela classe média, pelos estudantes, pela cultura, pela educação e pelo efeito multiplicador dos meios de comunicação social, buscando mudar a mentalidade, desvinculando-a do sistema de valores tradicionais, para implantar os valores ateus e materialistas.
É de suma importância para o triunfo da revolução mundial uma reforma intelectual e moral para lograr uma mudança de mentalidade nas sociedades ocidentais que foram constituídas por convicções, critérios, normas, crenças, pautas baseados na concepção cristã da vida.
As novas concepções se difundem utilizando sofismas, dando novas interpretações a fatos históricos, chegando a parafrasear o Evangelho em alguns casos, distorcendo “ensinamentos” de determinadas passagens bíblicas, tal como a expulsão dos mercadores do Templo, utilizando-os como argumentos para justificar a violência e moldar a imagem do “Cristo guerrilheiro”.
Ao proclamar o diálogo e aceitar o debate, o gramscismo seduz e atrai a contribuição de todos aqueles que, por simpatizar com a ideologia marxista - por esnobismo, conveniência ou negligência -, se somam, voluntária ou involuntariamente, à sua estratégia.
Graças à inoculação desse vírus gramsciano na sociedade brasileira, hoje é comum a louvação do invasor de terras e a demonização de quem ousa defendê-las com armas na mão. È corriqueira a defesa dos direitos de marginais e a condenação das ações policiais. É trivial a confusão entre interesses de Estado e interesses partidários, tudo perdoado porque os fins justificariam os meios.
No próximo domingo, os brasileiros darão um passo crucial para a definição do país que queremos para os próximos 50 anos. Isso porque a reeleição de Lula significará, sem qualquer sombra de dúvida, um salto rumo ao abismo, a um chavismo que gerará um grave quadro de instabilidade das instituições.

5 comentários:

Anônimo disse...

Prezado Álvaro,
Foi essa compreensão do gramscianismo que me fez afastar do PT e suas táticas, concentrando-me num cristianismo cada vez mais tradicional, um catolicismo longe dos bispos e pastores ditos da 'libertação'. Hoje me interesso mais pela teologia da conversão. Seu artigo é esclarecedor.
Parabéns.
Abraços,
Adalberto

Felipe Sil disse...

A revolução gramsciana pode ser percebida pela atitude de alguns de meus professores, que simbolizam o modo de agir da espécie em todo o Brasil. Estou generalizando, o que é sempre bom.Sempre tive "educadores" que me ensinavam sobre a grande luta de organizações criminosas como o MST. Uns ainda dividem os humanos em pretos e brancos. Esses são os funcionários que ensinam nossos jovens a serem alienados e a criticar sempre o estado neo-liberal (acredito que você concorda comigo que falar em estado neo-liberal em um país com uma das cargas tributárias mais altas do mundo é piada). Essa é a extamente a revolução gramsciana. Tudo começa na infância. Há até escolas do MST atuando Brasil afora.

Zé Costa disse...

Caríssimo Junqueira, parabéns pelo seu blog, seu texgto é bom e esclarecedor. Essa chilena é o que Stálin chamava em seu tempo de 'engenheiro de almas, conforme escreve Simon Montefiore em seu Livro Stálin a corte do Czar Vermelho,coloquei seu blog nos meus favoritos!

Um abraço e vamos ao Segundo Turno!

Anônimo disse...

Caro Álvaro Junqueira,

Bom, antes de qualquer coisa, peço licença para iniciarmos um diálogo acerca de suas considerações na réplica que você escreveu no blog do Reinaldo Azevedo. Considero extremamente salutar essa troca de idéias entre pessoas que possuem diferentes bagagens culturais, e, que, certamente, argumentam e defendem cavalheirescamente seus pontos de vista.
Como você pode perceber meu comentário foi bastante generalista, porque acredito que a melhor maneira de se iniciar uma conversa é fazendo um recorte em escala grande para, em seguida, direcionar melhor o tema. Talvez por isso o Weimar tenha sido um pouco incisivo nas suas considerações.
E essa leitura generalista pode parecer utópica - lembrando que o u-topos significa o não-lugar, em latim. Mas hoje, diferentemente do que escreveu Thomas Morus (ou Tomás More) em seu livro A Utopia, não existe mais o não-lugar. Logo, nenhuma idéia pode ser utópica – mas, não foi este sentido que quis dar ao comentário. Ele serviu mais como uma reflexão do que o mundo se tornou e para onde ele parece caminhar.
Como sociólogo, acredito que você já tenha lido algumas obras de Robert Kurz, entre as quais eu destaco Com todo vapor rumo ao colapso e O livro negro do capitalismo: um epodo à economia de mercado. Que, assim como a vasta obra do geógrafo brasileiro Milton Santos, se preocupa em apontar as mazelas do sistema capitalista e suas variações. Evidentemente eu acredito que não se pode simplesmente reverter a chave da história, entretanto, podemos fazer um apelo à necessidade da humanidade rever seus conceitos de progresso, desenvolvimento e liberdade.
A história tem mostrado que o modelo que você acredita ser peça de discurso de grêmio estudantil não foi capaz de equacionar os desajustes sociais e econômicos do planeta. Enquanto as nações mais ricas continuam a sua acumulação por espoliação, os países do bloco em desenvolvimento se devoram por um lugar ao sol. Isso para não falar das nações africanas que ainda não atingiram a primeira revolução industrial. Culpa delas? De seus habitantes? Ou de um colonialismo que jamais deixou de existir?
Mas, como escrevi no blog do Reinaldo Azevedo, estamos nos inclinando para uma discussão macro que envolve séculos de história, economia, geografia, sociologia, filosofia e antropologia. De Heródoto a Hobsbawn; de David Ricardo a Keynes; de Friederich Ratzel a Milton Santos; de Emilie Durkhem à FHC; de Platão à Marilena Chauí e do infame General Custer (“índio bom é índio morto”) a Lèvi-Strauss, sem me esquecer do embate criacionismo X evoluvionismo. Tudo isso num só e-mail é pretensão demais.
O Brasil dentro do contexto mundial deve sim ter nossa atenção. Ainda mais num momento político oportuno como esse. Nossa soberania está em xeque, e não estou falando do imbróglio com a Bolívia. Vamos continuar a emular o modelo que está próximo do esgotamento, ou vamos optar por uma alternativa mais sensata? Na disputa dos ECOS (economia X ecologia) de qual lado o país vai ficar?
Lembre-se, o Brasil está ajudando a destruir a floresta Amazônica quando permite a devastação de enormes áreas para a incrementar o agronegócio e sua pecuária extensiva. O Brasil está desertificando o já desgastado semi-árido nordestino com sua política de incentivo à exploração desenfreada da terra. E para constar, ambos os processos são irreversíveis. Isso sem contar a introdução de espécimes estranhas ao ecossistema brasileiro, caso emblemático do eucalipto para a exploração comercial, que acabam por consumir grandes quantidades de água do solo, sendo que suas extensas raízes podem chegar a atingir nossos lençóis freáticos. E a água não vai ser a commodity do futuro?
Para mim, é preferível trilhar o caminho do eco-socialismo do sociólogo francês Michael Lowy, do que as bravatas de Hugo Chavéz. Não é simplesmente ser partidário da esquerda de Noam Chomsky, de Tariq Ali, e do pessoal da New Left Review, mas, é, também, vislumbrar um Brasil localmente responsável por seus cidadãos e globalmente consciente de seu papel no planeta.
Não vou me estender mais. Acredito que esta discussão ainda vai se prolongar por outros e-mails.

Cordiais saudações,
Ricardo Safra de Campos, estudante de Geografia na PUC-SP.

Anônimo disse...

Alvaro

Conheci uma pessoa que acabou de fazer um Curso de História na USP!
Ela comentou que o próprio FHC, participou à pouco de um reestudo dos Livros do MARX e que chegaram à conclusão que pelo regime à época, tipo de vida, etc, o que ele realmente pregava era o que temos hoje, Capitalismo!
É o tal negócio, dependendo de quem lê a Bíblia, faz sua própria interpretação, de acordo com sua visão e intenções, concorda?

Betina